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Aposentado diz que foi orientado por médico a comprar equipamento para cirurgia cardíaca que nem chegou a ser usado.
Aposentado diz que foi orientado por médico a comprar equipamento para cirurgia cardíaca que nem chegou a ser usado.
Manaus, 09 de Fevereiro de 2012
MARIA DERZI
Munido de documentos, paciente acredita que foi vítima de um esquema de venda de materiais cobertos pelo SUS (Marcelo Cadilhe)
O aposentado Jueber Domingues, 75, paciente do Hospital Universitário Francisca Mendes, denuncia esquema de venda de equipamentos que, por lei, são cobertos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Depois de arrecadar R$ 5 mil para a compra de um estabilizador tecidual para ser utilizado durante a cirurgia de revascularização do miocárdio (sem circulação extra-corpórea), por indicação do médico Luís Alberto Saraiva, integrante da equipe médica do Hospital Francisca Mendes, Jueber Domingues descobriu que o equipamento é coberto pelo SUS e deveria ser disponibilizado, gratuitamente, durante o procedimento cirúrgico.
Além disso, o aposentado afirma ter descoberto, ainda, que o equipamento não foi usado durante a sua cirurgia. “O dr. Luís disse que eu precisava ser operado, mas que tinha duas maneiras de operar: uma seria com o coração parado e a cirurgia iria demorar para ser marcada, pois era arriscada devido a minha idade. O outro tipo de cirurgia seria com o coração funcionando”, disse.
Mas esse procedimento, conforme o médico teria dito ao aposentado, tinha um custo de material que o hospital não cobria e Jueber Domingues teria que pagar. “Esse custo era mais de R$ 5 mil, mas eu disse que só poderia conseguir R$ 5 mil. Então o dr. Luís me indicou um rapaz chamado Henrique, com o qual deveria falar por telefone e que me venderia o aparelho. Eles me fizeram assinar um termo de doação para o hospital e depois faria a cirurgia com o equipamento indicado pelo médico”, disse o aposentado.
Mas após o procedimento cirúrgico, familiares de Jueber tiveram acesso ao relatório de cirurgia assinado pelo médico residente Dorian Nogueira Cardoso. Para tirar a dúvida, entraram em contato com um médico da família, que não quis se identificar, e que explicou o laudo. Segundo esse médico, na descrição cirúrgica a cirurgia fora feita com circulação extra-corpórea.
“Com esse tipo de circulação, o aparelho que ele comprou não foi utilizado. A descrição cirúrgica é o documento de tudo o que foi usado e o que aconteceu na sala de cirurgia. Aqui no sexto item há a indicação de que foi usada uma cânula e foi realizada uma circulação extra-corpórea. No documento, pinça quer dizer que o médico pinçou a aorta e o coração foi parado. Houve a necessidade de uma cardioplastia, solução para parar o coração. Então, temos duas situações aqui: a primeira é que esse equipamento não precisava ser comprado pelo paciente e que, depois de comprado, não foi usado na cirurgia”, disse o médico da família.
Venda
Familiares de Juerbe afirmam que o mesmo homem (Henrique) que vendeu o equipamento para o aposentado faz parte da equipe cirúrgica do Hospital Universitário Francisca Mendes. “Quando vimos o mesmo homem que vendeu o aparelho para o papai entrar na sala de cirurgia, na equipe do hospital, descobrimos que era o perfusionista, pessoa que opera a máquina de circulação. Foi com ele que meu pai comprou o equipamento”, disse a filha de Jueber, a fisioterapeuta Lilian Moreno.
O aposentado apresentou a nota fiscal de serviços no nome da empresa N. O. da S. Júnior-ME, situada na avenida Rio Purus, 37, no bairro Nossa Senhora das Graças, e o recibo de compra do estabilizador tecidual da marca XPOSE 4, modelo XP-4000, lote nº 25016759, série 00132, com validade até junho de 2012, para ser utilizado na cirurgia cardíaca, no valor de R$ 5 mil. Quem assina o recibo pela empresa como sócio é Henrique Florentino, identificado pelos familiares como o perfusionista que participou da cirurgia de Jueber.
Por meio do número 3643-89XX a reportagem de A CRÍTICA tentou contato com Henrique Florentino e foi informada que ele é procurador da empresa que vendeu o aparelho para o paciente. Mas, segundo o médico, Henrique não trabalha na equipe do hospital e não participou da cirurgia.
Médico acusado apresenta justificativa
O cirurgião cardíaco Luís Alberto Saraiva Santos explicou que o paciente Jueber Domingues teve que comprar o equipamento porque este não estava disponível no hospital e o paciente corria risco de infarto dada a gravidade das lesões. Segundo ele, o Francisca Mendes atende o SUS com excelência, a preço de SUS. “O hospital compra materiais pela tabela SUS, porém este tipo de estabilizador, em Manaus, é representado por duas empresas e não tem tido fornecimento, uma vez que os representantes se negam a receber pela tabela SUS”, disse. Sobre a não utilização do equipamento, o médico explica que no início da cirurgia o paciente teve um desequilíbrio de sua condição clínica: “Por precaução, solicitei que fosse montado o kit de circulação extra-corpórea (material para fazer a cirurgia com o coração parado). A descrição cirúrgica foi feita pelo médico residente da equipe e acho que este colocou com circulação extra-corpórea, pois o kit foi aberto”.
O cirurgião diz que não é comum o médico indicar onde comprar os equipamentos. “Mas cabe ao médico orientar como isso pode ser resolvido o mais rápido possível. Me perguntaram quem venderia o aparelho e eu indiquei o sr. Henrique, que é quem tem menor preço. Nunca participei, em momento algum, da negociação da família com o vendedor”, afirmou o cirurgião.
Denúncia formal é aguardada
O diretor do Hospital Universitário Francisca Mendes, Pedro Elias, manifestou-se, por e-mail, dizendo que a direção do hospital não havia recebido, até aquele momento, denúncia formal sobre o caso. Ele disse que só poderá instaurar procedimento oficial se a denúncia se concretizar por parte da família do paciente. De acordo com Elias, se houver qualquer indício de desvio de conduta, a mesma será apurada com rigor.
A assessoria de imprensa da Secretaria de Estado de Saúde do Amazonas (Susam) disse que o secretário Wilson Alecrim tomou conhecimento do assunto por meio do contato feito pelo jornal A CRÍTICA e solicita que o paciente formalize a denúncia à Susam. “Estamos dispostos a apurar o caso por meio de auditoria da Susam, conforme o que está sendo apresentado”. Segundo Alecrim, a secretaria tem uma Comissão Permanente de Sindicância e a apuração dos fatos será iniciada tão logo a denúncia seja recebida.
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