Certos silêncios, por eloquentes, ajudam os tímpanos a prestar atenção nos ruídos que soam ao redor.
Assim foi com a Comissão da Verdade, criada pelo governo para escarafunchar as violações aos direitos humanos na era militar.
Em meio ao barulho, as Forças Armadas reagiram com o silêncio. Um silêncio bem alto, ensurdecedor.
Súbito, um general decidiu levantar a voz. Chama-se Maynard Marques de Santa Rosa.
Não é um general qualquer. Chefe do Departamento de Pessoal do Exército. Membro do Alto Comando.
O general falou sem mover os lábios. Gritou por escrito. O trombone de suas palavras trouxe ao centro do palco o som do silêncio de seus pares.
Movido por ira santa, o general Santa Rosa mostrou da rosa o espinho.
Anotou que os integrantes da comissão são os "mesmos fanáticos que, no passado recente, adotaram o terrorismo, o sequestro de inocentes e o assalto a bancos como meio de combate ao regime, para alcançar o poder".
Acrescentou: “Confiar a fanáticos a busca da verdade é o mesmo que entregar o galinheiro aos cuidados da raposa...”
“...A história da inquisição espanhola espelha o perigo do poder concedido a fanáticos...”
“...Quando os sicários de Tomás de Torquemada [1420-1498] viram-se livres para investigar a vida alheia, a sanha persecutória conseguiu flagelar 30 mil vítimas por ano".
Levados às páginas pela repórter Eliane Cantanhêde, os espinhos do general espetaram o coração do Planalto.
A criação da comissão fora referendada por Dilma Rousseff. Na definição do general, uma fanática que, no passado recente, adotou o terrorismo e todo o etc.
Ouvido, o comando do Exército dissera, na véspera, que o texto do general não passava de uma “carta a um amigo”.
Coisa que não traduzia o pensamento do Exército. Lorota. Santa Rosa apenas traduziu o pensamento do silêncio.
Pois bem, com a rapidez de um relâmpago, o ministro Nelson Jobim (Defesa) tratou de levar a cabeça de Santa Rosa à bandeja. Enviou a Lula o pedido de afastamento do (in)subordinado.
Em nota, a pasta da Defesa não deixou dúvidas quanto à motivação do escalpo. A Comissão da Verdade é parte do Plano Nacional dos Direitos Humanos.
Um plano que traz a assinatura de Lula. Reza a Constituição que o presidente é comandante em chefe das Forças Armadas. Portanto...
Defenestrado, o general fica à disposição do Departamento de Pessoal, que chefiava. Logo, logo será lotado numa geladeira do Exército.
Os militares foram devolvidos ao seu silêncio. Aguçando-se os tímpanos, pode-se ouvir, porém, os ruídos que continuam soando ao redor.
Por sorte, o barulho ecoa num Brasil bem diferente daquele de outrora.
Escrito por Josias de Souza às 19h29
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