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sexta-feira, 19 de novembro de 2010

Novo aumento para parlamentares é "injustificável", dizem analistas; veja quanto ganham as autoridades em Brasília.

O desejo de deputados e senadores de elevarem seus salários em pelo menos 18%, ainda que para repor a inflação dos últimos três anos, não se justifica sem a redução de outras benesses, dizem analistas ouvidos pelo UOL Notícias. Eles defendem que, se querem aumento, os parlamentares devem cortas suas verbas de gabinete, ou abrir mão de parte da cota mensal de passagens aéreas, ou ainda poupar na ajuda de custo.

Após as eleições deste ano, lideranças partidárias do governo e da oposição concordaram em debater o assunto. Contam com a anuência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cujo salário de R$ 11,4 mil é menor do que o dos congressistas, fixado em R$ 16,5 mil. O teto do funcionalismo público é estabelecido pelos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), em R$ 26,7 mil.

No entanto, ao contrário do chefe do Executivo e dos ministros da mais alta corte do país, deputados e senadores contam com generosas verbas de gabinete e cotas de passagens aéreas. E também trabalham menos dias em Brasília, uma vez que a agenda mais pesada do Congresso se dá entre terça e quinta-feira. As sessões de segunda e de sexta-feira costumam ser vazias e reservadas a discursos protocolares.

“Os ministros, o presidente e os ministros do Supremo ganham muito mal. Pessoas nessas posições devem ganhar bem. Mas os parlamentares não justificam seu custo”, disse Claudio Weber Abramo, diretor executivo da Transparência Brasil. “Não se conta apenas salário de parlamentar. Somando tudo, cada um controla mais de R$ 100 mil. Multiplique por 513 deputados e 81 senadores. Desperdício.”

Os deputados, por exemplo, recebem salário, até R$ 60 mil para contratar funcionários e ajuda de custo de, no mínimo, R$ 23 mil – incluindo passagens aéreas para os eleitos pelo próprio Distrito Federal, que a rigor na precisariam de passagens para voltar ao Estado de origem. Caso haja reajuste nos salários, para perto de R$ 20 mil, os parlamentares não prometem reduzir despesas extras. Técnicos do Executivo já argumentaram que o aumento não está previsto no orçamento 2011.

Nem ético, nem econômico

Abramo avalia que os reajustes para parlamentares, se vierem, devem ser ligados necessariamente às medidas de contenção de gastos. “A dificuldade é que, fazendo isso, eles minam a estrutura que lhes permite se perpetuar no poder. São essas verbas extras que vitaminam campanhas, que fazem distribuir informações de divulgação de mandato e que dificultam a renovação nas duas Casas”, disse.

Além do aspecto econômico, o serviço público também demanda uma visão ética que está distante da cobrança dos parlamentares por aumento de salário. O filósofo e cientista político Roberto Romano, professor da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), acredita que a comparação deve ser feita com os vencimentos da população em geral, distante do nível de vida dos parlamentares.

“Eles que reduzam o que recebem, porque não há justificativa para alguém que serve no Parlamento ter tantas benesses. Eles não precisam de reposição de inflação como um trabalhador comum”, afirmou. “É uma questão também ética e é muito simples: eles que comparem seus ganhos totais, com o que ganha a população média. A natureza da esfera pública não pode ser comparada à da privada.”

“A democracia é cara. Às vezes ela é impagável, sobretudo no Brasil. Os operadores do Estado, nos três poderes, acham que o contribuinte tem o dever de pagar e não receber nada em troca”, afirma. “No caso dos deputados e senadores, não há uma só prova de que eles precisam ganhar mais e manter mordomias. É uma visão que eles mantêm sem preocupação porque não há prestação de conta. Mas não é ético.”

Weber e Romano acreditam que os salários dos parlamentares já seriam o suficiente para nenhum deles apelar à corrupção. “Se eles ganharem o mesmo que um ministro do STF, como ainda desejam, haverá sujeira da mesma maneira”, disse o diretor executivo da Transparência Brasil. O filósofo completa: “Quantos deles entram pobres e saem milionários? Se ganharem o dobro, esses tipos não sumirão.”

Privado e público

Já para os cargos do Executivo, os especialistas vêem uma defasagem salarial que inviabiliza a contratação de altos funcionários que estejam no setor privado. Com mais de 20 anos de experiência em negociações desse tipo, Rosemary Sussenbach Costa, gerente da consultoria Place, diz que os cerca de R$ 10 mil pagos a ministros ficam muito abaixo da média de qualquer diretor de empresas medianas.

“Em São Paulo, um diretor de multinacional pode ganhar até R$ 50 mil. Isso afasta os mais jovens do poder público, porque quem não fez seu pé de meia jamais troca um lado pelo outro”, afirma ela. “Mas há também no setor público uma boa oportunidade de crescimento para mulheres, como a presidente eleita. Nas empresas privadas a ascensão das mulheres é mais difícil. São raras as executivas ricas e poderosas.”

Weber também vê fragilidades no sistema salarial do Poder Executivo. “O presidente da República nem sequer tem aposentadoria. É claro que existem possibilidades após a passagem pela Presidência, mas o Estado deveria pagar por isso. Assim como deveria pagar melhor aos ministros, para não terem de colocá-los na presidência de conselhos das estatais. Hoje, só assim dá para tentar trazer gente dinâmica”, diz.

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