MÁRCIO FALCÃO
da Folha Online, em Brasília
Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) abriram uma brecha hoje para reabrir o julgamento do terrorista italiano Cesare Battisti caso o presidente Luiz Inácio Lula da Silva não cumpra o tratado de extradição firmado com a Itália. Em novembro, o STF aceitou o pedido da Itália de extradição de Battisti, mas deixou com o presidente decisão final.
Hoje, os ministros reiteraram que continua com o presidente a última palavra sobre a extradição de Battisti. No entanto, os ministros entenderam que o presidente pode vir a ser responsabilizado se decidir manter Battisti no Brasil --e dessa forma descumprir o tratado de extradição assinado com a Itália.
A decisão de Lula extraditar Battisti voltou a ser discutida hoje, quando o STF analisou questão de ordem levantada pelo governo da Itália a respeito do voto do ministro Eros Grau.
Ao proclamar o resultado do julgamento, no dia 18 de novembro, o presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, determinou que a deliberação do presidente Lula seria um ato discricionário --de vontade absoluta--, podendo descumprir o tratado.
Na reclamação, o governo da Itália argumentou que o ministro Eros Grau não tinha referendado esse entendimento.
Grau esclareceu que seu voto diz que o presidente tem de respeitar os termos do tratado de extradição. "No meu entender, o ato não é discricionário, porém, há de ser praticado nos termos do direito convencional. Não existe dúvida quanto a esse ponto, votei com os ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa, Carmén Lucia e Ayres Britto com a decisão de que o Supremo autoriza e quem vai executar ou não é o presidente da República", disse.
No voto dos ministros Marco Aurélio, Joaquim Barbosa, Carmem Lucia e Ayres Britto --que formaram maioria com Eros de que o presidente Lula não precisava seguir a autorização do STF para que o terrorista fosse entregue à Itália--, eles não vincularam a decisão de Lula ao tratado.
Para o ministro Marco Aurélio, o questionamento é uma manobra do governo italiano para forçar o presidente Lula a entregar o terrorista. "O que pretende o governo [italiano] é uma virada de mesa. [...] Não se pode reabrir o julgamento, ainda que se tenha um conflito entre fundamentos e dispositivos. A segurança jurídica é básica no Estado democrático de Direito. Não podemos ficar depois de um julgamento reabrindo em sessões subsequentes o que assentado de forma correta ou não pelo plenário", disse.
Segundo o relator do caso, ministro Cezar Peluso, as consequências dessa mudança ainda não podem ser avaliadas. "A decisão [do STF] não vincula o presidente da República a cumprir a decisão do STF de extraditar Battisti. As consequências disso [de uma violação ao tratado] são outro capítulo', disse.
Com o esclarecimento do voto de Grau, o STF retira que o ato da decisão do presidente é discricionário e esclarece que há indicação para que o tratado seja respeitado. Com essa ponderação, há possibilidade de recurso na Suprema Corte, se Lula decidir manter o italiano no país.
Reportagem publicada pela Folha no dia 20 de novembro já informava que assessores jurídicos do STF entendiam que Lula poderia responder por crime de responsabilidade perante o Senado se descumprisse o tratado.
A lei nº 1.079 de 1950, que trata dos crimes de responsabilidade cometidos por autoridades, prevê no parágrafo 11 do artigo 5º que "são crimes de responsabilidade contra a existência política da União violar tratados legitimamente feitos com nações estrangeiras".
O tratado foi firmado em Roma em 1989 e ratificado pelo Congresso em 1993 e tem força legal. Ele permite que o presidente se recuse a entregar o italiano. Diz, contudo, que o fato precisa ser 'motivado', justificado.
De acordo com a reportagem da Folha, existem sete opções para que o presidente deixe de entregar um extraditando, mas a única que poderia ser usada no caso é dizer que o italiano poderá ser submetido a "atos de perseguição por opinião política".
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