Equipamentos de gravação de áudio e vídeo estão em salas reservadas de quatro penitenciárias federais
Conversas devem ser invioláveis, dizem advogados; União diz que só fez grampo com autorização judicial
MATHEUS LEITÃO
LUCAS FERRAZ
DE BRASÍLIA
O governo federal instalou equipamentos de gravação de áudio e vídeo nos parlatórios, as salas reservadas para a conversa entre advogados e presos nas quatro penitenciárias federais do país.
Para advogados, a medida é totalmente inconstitucional, já que essas conversas deveriam ser invioláveis.
A existência do equipamento consta de um relatório feito pelo próprio governo.
Em pelo menos um caso, o governo admite ter "grampeado" conversas entre presos e seus advogados. Mas o Ministério da Justiça afirma que só acionou o mecanismo após autorização judicial.
O presidente Nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Ophir Cavalcanti, esteve com o ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, para tratar das denúncias. "Que segurança a OAB tem de que todas as conversas entre advogados e clientes não estão sendo gravadas?"
"É um absurdo porque o Código de Processo Penal garante a conversa reservada entre cliente e advogado", diz Fábio Tofic Simantob, diretor do Instituto de Defesa do Direito de Defesa.
Para ele, esse tipo de gravação só faria algum sentido se o advogado fosse suspeito de participar de alguma atividade criminosa.
"Você não pode gravar a conversa apenas para extrair informação do cliente. É eleger a bisbilhotice como melhor forma de investigação", disse Simantob.
Flávia Rahal Bresser Pereira, mestre em direito processual penal pela Universidade de São Paulo, também considera a iniciativa "absurda".
"A conversa entre advogado e cliente deve ser sigilosa. Sem isso, é impossível exercer o direito de defesa."
CARÁTER EXCEPCIONAL
O Ministério da Justiça alega, em carta à OAB, que os equipamentos são voltados para "segurança" e "inteligência", mas o uso "não faz parte da rotina da penitenciária". Só são usados em "caráter excepcional" e com "autorização judicial".
A existência do equipamento veio à tona após sete agentes penitenciários de Campo Grande denunciarem à OAB de Mato Grosso do Sul a ocorrência de crimes e faltas disciplinares graves.
O Ministério Público Federal investiga o caso. Ao responder a um questionamento sobre a possível violação dos direitos dos presos nesse presídio, a Coordenadora-Geral de Informações e Inteligência Penitenciária, Luciane Cristina de Souza, admitiu os aparelhos por conta de "Plataformas de Inteligência", um serviço de investigação interno dos presídios.
O presídio já abrigou os traficantes Juan Abadia e Fernandinho Beira-Mar.
O juiz federal Odilon de Oliveira autorizou o monitoramento dos advogados de Beira-Mar e Abadía. Em 2008, investigação revelou que eles planejavam sequestrar autoridades e parentes. O juiz concorda que o monitoramento fere a privacidade dos advogados, mas ressalta que toda investigação é invasiva.
"O que não pode é haver monitoramento sem autorização judicial, é preciso haver indícios." Procurado, o Ministério da Justiça não se manifestou sobre o assunto.
Colaborou JOSÉ BENEDITO DA SILVA, de São Paulo
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